top of page

Na música e na vida: Feito é melhor que perfeito!

Atualizado: 4 de jan. de 2023

A maior lição que aprendi durante a pós-graduação nos Estados Unidos é uma coisa muito simples, mas extremamente importante para nós criadores musicais. Uma entendimento que mudou a minha vida enquanto compositor, arranjador e produtor.


"Feito é melhor que perfeito!" Esse é um conceito que não só serve para a música, mas para todo tipo de criação e realização, artística ou não.


Quer entender um pouco mais sobre este conceito? Vou dividir com vocês minhas reflexões; como eu cheguei a esta conclusão. Tudo baseado nas minhas experiências e evolução musical, desde frustrações pessoais no Brasil, até grandes realizações profissionais aqui nos EUA.



O perfeccionismo pode ser o inimigo

Eu sou uma pessoa muito autocrítica, perfeccionista. Isso, de certa maneira, bloqueou minhas criações durante muitos anos. Eu começava a escrever uma música, colocava as primeiras ideias no papel e, de repente, travava. Eu achava que era melhor parar e pensar melhor naquela ideia antes de continuar. Quase sempre eu chegava à conclusão de que meu trabalho não estava tão bom quanto eu gostaria e que aquela ideia não era tão boa quanto poderia ser. Nesse momento eu abandonava essa nova criação, antes mesmo dela começar a tomar forma.


Em função disso, muitas vezes eu produzia bem menos do que eu poderia produzir. Inclusive, na época, levei estas questões para a terapia, para entender por que eu sentia que tinha capacidade de compor mais, de criar mais, mas não conseguia destravar o processo.

É preciso caminhar

Com o passar dos anos, quando cheguei à Universidade de Miami para fazer o meu mestrado em Studio Jazz Writing, na Frost School of Music, me deparei com a maneira de trabalho proposta pelo meu orientador, Gary Lindsay. Ele esperava produção e entrega frequente! Eu tinha exercícios composicionais semanais, arranjos para big bands, orquestrações, e uma série de outras coisas com exigências relativamente altas.


Além disso, eu também tinha a responsabilidade de ter ido para lá como bolsista, como compositor em residência (Composer Fellow) do Henry Mancini Institute. Isso significava que eu tinha responsabilidade como compositor e arranjador do Instituto. Ou seja, minha carga de escrita e de produção musical era muito grande. E eu tinha que entregar!


Toda esta rotina e os comentários do meu orientador me estimularam a colocar as ideias no papel e escrever, por mais que eu não estivesse satisfeito com minhas criações em um primeiro momento, ou não achasse que estava perfeito. Eu tinha que caminhar! Eu tinha que criar!


Rafael Piccolotto de Lima acompanhando a passagem de som da orquestra do Henry Mancini Institute em Miami.

E não se enganem achando eu entregava trabalhos ruins simplesmente por entregar. Pelo contrario, a responsabilidade era muito grande e a pressão por qualidade era muito alta. Afinal de contas, eu estava em uma das melhores instituições de ensino musical dos Estados Unidos e os artistas para os quais eu cheguei a escrever incluem lendas do jazz como Chick Corea e Terence Blanchard.


O segredo foi em abaixar as expectativas pessoais no início da criação para permitir que o processo continuasse. Com os primeiros rascunhos feitos, eu podia aprimorar minhas criações musicais: revisar e editar minhas obras até chegar em um resultado satisfatório.


Edição como parte do processo

A ficha caiu para mim: a edição faz parte, sim, do processo criativo! Inclusive, no meu curso online de Processos Criativos, tem um capítulo dedicado a isso, com vários exemplos.


Esse entendimento de que a edição faz parte do processo criativo é essencial. Na hora que colocamos as ideias no papel, trabalhamos em cima delas, outras ideias surgem. O ato de escrever faz parte do desenvolvimento do pensamento, a escrita é - inclusive - uma maneira de expandir nossa capacidade mental.


Como um experimento, tente resolver um problema matemático complexo de cabeça, é muito mais difícil, não é? Quando colocamos as ideias no papel, conseguimos raciocinar melhor e enxergar coisas que não percebíamos antes. O mesmo acontece com a criação musical.


O processo flui no momento em que tomamos consciência de que o que escrevemos no início não é necessariamente o que estará no fim. E mais! Tirando essa pressão de que a música precisa estar perfeita logo de cara, fica muito mais fácil ultrapassar as barreira que o ego e a autocrítica nos colocam.


Muitos músicos que trabalham comigo brincam que eu faço muitas revisões, que a cada ensaio surgem versões novas. Isso é verdade, eu não me prendo ao que eu escrevi no início. Talvez, no futuro, eu olhe e perceba que eu poderia ter escrito de outra forma, e se eu achar que vale a pena mudar, acredite, mudo mesmo!


É comum eu ter várias versões da mesma composição ou arranjo, criações musicais que eu vou modificando ao longo dos anos, até o momento em que decido parar; encontro uma versão final, geralmente a ser gravada.


Está feito? Agora pode chegar perto de perfeito!

Entendendo que feito é melhor que perfeito, agora é possível chegar mais próximo ao perfeito. Isso porque nos colocamos uma posição de constante produção e evolução. Esta é uma das grandes lições ou talvez a maior lição que eu tirei deste meu período de pós-graduação aqui nos Estados Unidos.


Meu período na Universidade de Miami foi uma das épocas em que mais produzi na vida! Isto me fez crescer e amadurecer muito como compositor e arranjador. Nesses anos eu consegui subir um grande degrau na minha carreira! Passei de um aluno talentoso, alguém com potencial, para um profissional reconhecido no mercado, com muitas premiações no currículo, incluindo uma indicação ao Grammy.


E você, tem colocado suas ideias no papel? Tem produzido bastante? O que já tem feito que pode chegar perto de perfeito?


E, se o seu processo não está fluindo como você gostaria, te convido a conhecer meu curso Processos Criativos. Ele pode te ajudar nesta missão em busca das suas melhores versões!


Epílogo: a origem da palavra

Podemos ter a perfeição como aspiração, idealização. Mas devemos refletir sobre o que realmente desejamos.


Ao pesquisar a origem da palavra, tive uma reflexão libertadora: "perfeito", em latim, significa feito por completo, feito por inteiro, já terminado, já concluído. Será que queremos - mesmo - tomar essa forma? Não seria essa uma definição de morte? Perfeição é a ausência de possibilidade de mudança, de processo, de evolução.


Acredito que não devemos ter a perfeição - necessariamente - como um lugar a se chegar tão cedo, mas sim, entende-la como uma busca que nos põe em movimento, nos propulsiona em direção a evolução. Ao mesmo tempo, pensar que aceitar a imperfeição - enquanto estado de transformação e potencial de realização - é abraçar a condição humana. E é nela que a arte floresce.

 

Gostou do conteúdo?


Deixe nos comentários dúvidas e sugestões para os próximos blogs! E não deixe de visitar os meus perfis no Instagram, Facebook e o canal do YouTube para vídeos completos com conteúdos exclusivos!


 
Rafael Piccolotto de Lima - Compositor, arranjador, diretor musical, produtor musical e educador
Sobre o autor

Rafael Piccolotto de Lima foi indicado para o Grammy Latino como melhor compositor erudito. Ele é doutor em composição de jazz pela Universidade de Miami e tem múltiplos prêmios como arranjador, diretor musical, produtor e educador.


Suas obras foram estreadas e/ou gravadas por artistas como as lendas do jazz Terence Blanchard, Chick Corea e Brad Mehldau, renomados artistas brasileiros como Ivan Lins, Romero Lubambo, e Proveta, e orquestras como a Jazz Sinfônica Brasileira, Orquestra Sinfônica das Américas e Metropole Orkest (Holanda).


Criadores musicais (conteúdo educacional):

Rafael Piccolotto de Lima (conteúdo artístico):
118 visualizações0 comentário

Posts recentes

Ver tudo
bottom of page